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'De uma série de pepinos' por Estela Sokol

  • Foto do escritor: Vitória Machado
    Vitória Machado
  • 2 de jul. de 2023
  • 3 min de leitura

Atualizado: 3 de jul. de 2023


Em 1979, nasce Estela Sokol, artista e paulistana.

Ela vive e trabalha até hoje em São Paulo, onde cria uma arte marcante e passeia por diferentes materiais, como o concreto, plástico, tecidos, resinas, cera de abelha, madeira, latão, pigmentos fotoluminescentes e muitos outros – combinações são criadas até mesmo entre elementos vistos como antagônicos, como o mármore e o acrílico. Sokol usa a luz e a cor como pivôs de sua pesquisa, a variedade de matérias primas utilizadas trabalham ao redor e à serviço da exploração da cor e luz em diferentes tonalidades e alterações, através de um raciocínio pictórico materializado não apenas em galerias, como também em locais públicos e na natureza.

Usando desta abordagem particular, seguiu transformando seu estilo e participou de mostras no Brasil e por exemplo, no Museu de Taipa na China, Bycr Gallery de Milão e na Inglaterra por meio da Gallery 32 em Londres, sendo tanto individuais quanto coletivas – algumas pedem citação, como as individuais ‘WXRTD-320’ de 2005 exposta em São Paulo, ‘Licht Konkret’, exposta na Áustria em 2011 ou então, seu trabalho instalado no Largo da Batata em 2018, intitulado ‘Greta Garbo’.

Em seu site, ela intitula uma sequência de obras feitas em 2021 como ‘pepinos’, ou então ‘de uma série de pepinos (sad & brazilian)’, composta por vários quadros de feltro formando uma mistura de conjunto e unidade – “não posso dizer que eles não existam sozinhos, mas eles existem melhor em conjunto”, é o que a artista diz à Casa de Cultura do Parque, também casa da exposição.

Um trabalho iniciado a partir do convite feito por Claudio Cretti, a artista teve a sua disposição uma parede de 280 x 1020 cm, medida que dá nome ao projeto. No vídeo de apresentação, Sokol afirma uma mudança em seu processo criativo durante o período de isolamento social, efeito da pandemia de Covid-19 e momento em que a série foi desenvolvida. Este contexto modificou fatores como tempo e espaço, transformando então suas criações – a artista declara: “por estar trabalhando em casa, realizei trabalhos bidimensionais, […], trabalhos que são uma serie”, como acontece em ‘pepinos’.

A série indica a continuação nas experimentações com cores e materiais industriais. Sokol fez pinturas sem tinta em quadros bidimensionais com o uso das sobreposições de tecidos de feltro, produzidos com as cores da paleta industrial, explorada pela artista que coletou diferentes colorações disponíveis. Ela usou das diversas possibilidades de composição e harmonia cromática, jogando com as figuras e o fundo – ganhando potência e impacto com a forma que é apresentada em seu site: fotos das peças individuais exposta em sequência, com rápidos intervalos e cores vibrantes.

Outro ponto curioso reside em seu título, pois além da referência direta ao meme “sad & brazilian” (ou então “triste e brasileiro” ao ser traduzido), a obra também aponta o sentido popular e figurativo de “pepino”: uma situação apresentada como problema ou complicação – isto porque o vegetal é difícil de digerir, logo, uma boa metáfora para situações difíceis de passar. Celso Ferrarezi Junior, professor e pós-doutor em semântica, diz para a Revista Abril: “Uma analogia se dá pelo cruzamento de elementos em campos culturais diferentes. ‘Problema’ é uma palavra genérica. Então procuramos exemplos para ilustrá la”.

Sokol afirma ter criado antes de nomear, sinalizando processos particulares de seu trabalho, ainda assim, este título dado a posteriori abre ainda mais portas para a interpretação. Analogias são modos de ilustrar sentidos, através do uso de elementos diferentes entre si. É o que ocorre no momento da nomeação e, talvez inconscientemente, no que a antecede – isto é, o tal cruzamento de diferenças vindas por meio da ousadia de misturar materiais e cores, pintando sem pintura, na escolha do significante que dá nome e traz consigo significados pré-estabelecidos. Além disso, ‘pepino’ denuncia um problema, aqui literalmente ilustrado por imagens, criadas em meio a um contexto problemático, pandêmico, incerto, enclausurado.

A tentativa de ilustrar problemas se depara com uma característica da arte – se pensarmos em uma linha lacaniana –, pois a mesma se apresenta como tentativa de dar destino ao irrepresentável, por exemplo o desconforto efeito da nossa interação com o mundo. Através da arte, o artista pode elaborar o que é desagradável ao Eu, pois como Lacan diz, a arte é uma forma de organização ao redor do vazio – diante de um dado implacável como a pandemia, a criação traça um estreito e talvez estranho caminho de articulações e signicações, por vezes balizadores de nossa existência em tempos de tantos ‘’pepinos”.

Em resumo, a série apresenta uma certa dose de humor e muitas doses de personalidade. Evoca o duplo sentido no título e intriga com seu modo de materialização, me faz pensar como os problemas, ou melhor, como os ‘pepinos’ podem ser atravessados com o uso da criatividade, seja os resolvendo ou simplesmente criando a partir deles.

E o que você já criou com seus ‘pepinos’?

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